Promotor
Associação Zé dos Bois
Breve Introdução
Molly Nilsson
A pop continua a ser um território fértil e um canal privilegiado de comunicação emocional. Será sempre ousado abordar temas mundanos, mas complexos, invariavelmente ancorados no enigma e no fascínio do existencialismo humano. Excluindo, naturalmente, os produtos polisaturados que dominam uma indústria cada vez mais algorítmica e homogénea, é deste domínio que emergiu alguma da poesia contemporânea mais original das últimas décadas.
A sueca Molly Nilsson inscreve o seu nome nesse exercício — surgindo como uma perfeita voz geracional, se assim quisermos, desta linha temporal que atravessamos. Em criança, a aspiração de um dia se tornar realizadora de cinema já apontava para uma natureza de cronista: observação, narração e projeção de histórias. Foi em Berlim, no início da idade adulta, que se entregou à escrita de canções. O tom confessional espelha uma consciência política, onde a repetição procura resistir à alienação.
É através da sua própria Dark Skies Association que nos tem chegado uma discografia de rara coesão e intensa atividade. São já onze discos no percurso, sustentados por uma ética punk de trabalho incessante e uma constante busca por inovação. Zenith será um ex libris para muitos; contudo, os mais recentes Imaginations ou Extreme demonstram uma clara necessidade de experimentação — dentro de uma noção muito própria do que essa abordagem significa. Sem comprometer nem conceder, Nilsson desvendou um mundo fascinante de sintetizadores húmidos, ritmos enevoados e uma voz glacial, algures entre Nico, Liz Fraser e Gina X.
O novo álbum, Amateur, refina a matéria de Nilsson e eleva a sua presença singular. Resgatando a etimologia da palavra, assume-se como uma verdadeira carta de intenções: a ideia original de alguém devoto a algo e a sua posterior distorção cultural, associada à falta de conhecimento ou experiência. O que ficou por explicar nessa transição? São esses pontos perdidos que a artista sueca potencializa sob a forma de hinos pop que apetece apelidar de intemporais. Até porque existe aqui um gosto assumido pelo paradoxo: do anacrónico ao futurista, do melancólico ao esperançoso, do real ao onírico. Uma queen na esfera que atravessamos — e que tantos ainda desconhecem. Imperdível.
NA
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Scott Hardware
O que vem depois de recusar o impulso de tentar continuar a acompanhar? No seu último álbum, Overpass, o artista Scott Hardware, que vive em Toronto e Lisboa, retrata a dor e a tragicomédia do que é preciso para enfrentar o momento. Evocando simultaneamente o fascínio assombroso do glamour de Hollywood e as silhuetas difusas do pop industrial dos anos 90, Hardware prepara o cenário para examinar a futilidade, com um certo desdém, um sorriso meio forçado e a determinação de ceder à gravidade do mundo.
Revisitando a linguagem sonora dos musicais off-Broadway e da antiga grandeza de Hollywood, Hardware passou os últimos três anos a conceber meticulosamente cada som do seu álbum à mão. Gravado em Lisboa, Overpass foi criado entre longas caminhadas ao pôr do sol em centros económicos em ruínas e uma variedade de rostos de diferentes sítios do mundo durante aulas online. A sua paleta inspira-se na opulência exuberante de Jacques Demy, na desolação romântica do cinema New Wave de Hong Kong e de Leslie Cheung, e no existencialismo maximalista dos clássicos da HBO dos anos 2000; cada influência refratada através da lente idiossincrática de Hardware.
O resultado é uma mistura instintiva de baladas pacientes, valsas conspícuas e riffs propulsivos. É uma reformulação exagerada de clichés descontentes; um abraço aberto à pompa e circunstância para um público de uma pessoa, ou nenhuma. Overpass é um lembrete de que, apesar do cenário de um mundo cada vez mais restrito e doloroso, criar torna-se um ato de necessidade intemporal e obstinada.
«Este álbum demorou muito tempo a ser feito. Fui encarregado de fazer um disco no meu portátil, relativamente isolado, enquanto trabalhava num emprego online muito mal remunerado. O resultado é exagerado e um pouco amargo — um disco com um sorriso irónico. Espero que gostem.»
Abertura de Portas
21:00
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